sábado, 29 de junho de 2013

Desonra e Infâmia

Há uns dias, ao fazer a ronda semanal pelas crónicas da Visão, cruzei-me com um texto de José Luís Peixoto. Por muito grosseira que considere a sua escrita, é uma actividade prazerosa deleitar-me com as suas iluminadas palavras - de quando em vez, para não enjoar. Na última que li, José Luís Peixoto fazia uma ode a' Os Maias, um livro que, nas suas palavras, mudou a sua vida para sempre.
Leio há pouco, com horror, que José Luís Peixoto é apenas um dos escritores que darão continuidade a'Os Maias, numa iniciativa do Expresso.
A ideia não é original; recordo-me de ter de fazer o mesmo exercício, relativamente ao livro Se perguntarem por mim, digam que voei, da Alice Vieira, num concurso literário em que participei no 7º ano. Esse livro, tal como Os Maias, tem um final aberto o suficiente para essa ideia ocorrer quase instintivamente ao leitor. Receio, porém, o alastramento desta adulteração de obras intocáveis. Há uns tempos, também pela mão de JLP, os Lusíadas foram reescritos. Sim: José Luís Peixoto pegou numa das maiores obras líricas da humanidade, e reescreveu-a.
Entendo que a ideia de pegar nos Magnum Opus dos dois maiores artistas da palavra em língua portuguesa e vê-los reescritos pelo pior é ludicamente muito interessante. Pelo humor, pelo entretenimento, pela jocosidade, é uma boa experiência. Mas se é para se levar a sério, é um sacrilégio de proporções bíblicas. E José Luís Peixoto, mesmo considerando ele a sua escrita, por certo, de qualidade inabalável, deveria reconhecer que prosseguir um livro terminado há mais de um século por um colega escritor que pretendia que este terminasse daquela forma para a eternidade é profanação de herança artística. O mesmo se aplica, naturalmente, aos restantes redactores dos próximos capítulos d'Os Maias.
Nem é caso para dizer que Eça rebola no seu túmulo ao saber desta notícia. O mais provável é que este se levante e venha resolver o assunto pelas próprias mãos. Se a indignação que sinto me levantaria a mim do mundo dos mortos, nem quero imaginar o que pode fazer ao cadáver putrificado de Eça. Por via das dúvidas, dormirei de porta trancada, para que o seu regresso por vingança não passe por minha casa, onde Os Maias permanecerão inalterados.

3 comentários:

  1. Recomendo "Cordeiro - O Evangelho Segundo Biff", de Christopher Moore. Adequa-se a ti!

    ResponderEliminar
  2. É, na verdade, um sacrilégio de proporções bíblicas!!!

    ResponderEliminar
  3. Queres aprofundar a tua opinião?

    ResponderEliminar